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A polivalência táctica é, hoje, uma das componentes mais trabalhadas pelos treinadores e responde às exigências modernas do jogo, sobretudo à necessidade de, em pleno jogo e sem mudar os protagonistas, ser capaz de colocar problemas diferentes aos adversários. Foi assim que, aos poucos, durante a década de noventa, os responsáveis técnicos começaram a prescindir de um dez puro, um organizador de jogo posicionado atrás da linha de avançados e entre estes e os centro-campistas. A velocidade do jogo aumentou, a capacidade de pressão à zona também e deixou de fazer sentido, sob pena de perder-se parte significativa do equilíbrio na pressão, utilizar um homem com funções exclusivamente de construção. Os puristas do futebol viram na irreversibilidade dessa conceptualização mais tacticista uma heresia. Todavia, e volvidos alguns anos da "extinção" do dez puro, não há evidência de que a aposta na rotação mais alta e na polivalência impeça o bom futebol, como tão bem provou o Barcelona de Guardiola, por exemplo. Em todo o caso, naquilo que alguns viram um retrocesso, talvez deva ver-se a evolução natural que decorreu do crescimento da dimensão física do jogo e, com ela, da primazia do perfeccionismo defensivo, antes da nota artística.

 

Essa transformação está, agora, a chegar aos jogadores de ala, outrora vistos como gazuas em profundidade e trunfos na transição, quase sempre encostadas à linha. Hoje, e com a emancipação do 4-2-3-1 (e suas derivações, como o 4-1-4-1, no Mundial 2010), não faz sentido ter extremos puros. Os avançados são mais móveis e essa mobilidade é melhor aproveitada com médios versáteis, capazes de chegar à zona de finalização e, ao mesmo tempo, de ocupar os corredores laterais em posse e voltar a posições mais interiores na perda dela. É sobretudo o equilíbrio do espaço central, com um ou dois pivots e uma segunda linha de médios, que motiva o recurso a jogadores mais versáteis. São os chamados interiores, conceito recuperado de outras eras e que, hoje, são vitais em qualquer equipa. Fecham o corredor central em apoio à primeira linha, quando sem posse de bola; abrem o jogo às laterais quando a recuperam. São esses os requisitos do interior moderno de equipa grande: velocidade, capacidade de pressão, inteligência a construir, critério no passe, gestão de compensações tácticas e cultura posicional de corredor.

 

O exemplo acabado dessa transformação é Angel Di Maria. O ex-Benfica tornou-se, no consulado de Ancelotti em Madrid, um curiosísssimo híbrido de médio interior e extremo. Quando em posse, é capaz de assumir o jogo e construir, ou no espaço central, ou no corredor esquerdo (a sua posição original). Sem posse, junta-se a Modric, na segunda linha do meio-campo madridista, à frente do pivot, Alonso. E há inúmeros outros exemplos de abdicação do extremo puro, em favor do médio interior versátil - e alguns coincidem com a "extinção" do 10. Cazorla (Arsenal), Vidal (Juventus), Hazard (Chelsea), Silva (Man City) ou Iniesta (Barcelona), com características diferentes, são a evidência desta mudança.  O que não quer dizer que o jogo lateral tenha perdido influência. Apenas é interpretado espacialmente de forma diferente.

 

 

 

 

 

Angel Di Maria: A redefinição táctica do extremo

Março 24, 2014

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