top of page

POSTO DE ESCUTA Surface Envy

Tendo sido parte nuclear dos motins femininos que emergiram do rock americano em meados da década de noventa, o trio Sleater-Kinney veio a estabelecer-se como uma das mais firmes descendências do punk durante cerca de uma década, galgando as fronteiras do underground com linguagens estéticas simples mas assertivas, em suporte de um discurso de emancipação da mulher e de uma certa libertinagem sócio-política. Corin Tucker, Carrie Brownstein e Janet Weiss rapidamente se tornaram favoritas de certas facções da crítica especializada, em razão de uma discografia consequente e que, a despeito de não brotar um grande êxito (comercial, bem entendido), ergueu um catálogo de canções cheias de intenção, num registo panfletário muito ao jeito do sentido de urgência insurrecta da época. O fenómeno foi crescendo, talvez até mais do que lhe estava destinado, tocando gradualmente públicos maiores, sobretudo a partir da viragem do século e até à dissolução (inesperada e inexplicada) do trio, já em 2006. Alguns projectos paralelos depois e uma década volvida desde The Woods, anterior registo de estúdio, as Sleater-Kinney reaparecem como tinham ido: envoltas na mesmíssima enigmática surpresa que as empurrou para o hiato de dez anos.

 

E que dizer deste No Cities to Love? O orbe rock é hoje um leito de acomodação que tem pouco que ver com o ADN das Sleater-Kinney. O espírito insurgente delas não é senão um oásis num mundo musical em que o idealismo é mandado às malvas e trocado pelo experimentalismo sónico e a lírica certinha. Talvez por isso, a primeira impressão (ilusória) é de que No Cities to Love é um erro cronológico que não encaixa neste tempo. E esse é, em boa verdade, o melhor elogio que pode fazer-se ao oitavo disco do trio e à oportunidade do seu regresso. Continua a fazer todo o sentido este rock que, em galope urgente, se perfila para tomar posição face ao conformismo geral. E fá-lo à custa de construções melódicas muito precisas, apuradas até ao tutano, sem artifícios e fintas, e tremendamente eficazes a chegar onde querem. Tal como as Sleater-Kinney obravam há dez anos.  

Fevereiro 12, 2015

Sleater-Kinney No Cities to Love

Sub Pop Records, 2015

 

 

Crítica Filho da Mãe - Cabeça

7,7

 

bottom of page